De há muito associações de classe que representam Delegados de Polícia investem judicialmente contra as normativas estaduais, que autorizam a lavratura de Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO) por outras autoridades policiais, que não aquelas estabelecidas pelo parágrafo quarto do artigo 144 da Constituição da República (“§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.“), ainda que, no microssistema dos juizados especiais, a Lei nº 9099/95 não o afirme assim (“Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.”) e, tampouco o Código de Processo Penal (“Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.“).
No dia 25 de novembro de 2020, o Conselho Nacional de Justiça, julgando o Procedimento de Controle Administrativo 0008430-38.2018.2.00.0000 já decidira que a tese de prerrogativa exclusiva, para a lavratura de TCO, sustentada pelos Delegados de Polícia, não merecia acolhida:
“[…] a orientação mais recente do Supremo Tribunal Federal é no sentido de interpretar a expressão “autoridade policial” constante no artigo 69 da Lei 9.099/95 em sentido amplo, de forma a alcançar outros órgãos de segurança pública. A lavratura de TCO’s por policiais militares além de não configurar invasão na competência da Polícia Judiciária, ainda atende aos objetivos da Lei 9.099/95. Neste caso, o registro de infrações penais é balizado pelos princípios da efetividade, oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.” (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Procedimento de Controle Administrativo 0008430-38.2018.2.00.0000. Requerente: SINDICATO DOS DELEGADOS DE POLICIA DO DISTRITO FEDERAL. Requerido: CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS e outros. Julgado em 25 de novembro de 2020). Veja o Acórdão na íntegra: Acórdão PCA 8430-38.2018-2-11
Essa decisão do Conselho Nacional de Justiça viria a consolidar o ENUNCIADO 34 do Fórum Nacional de Juizados Especiais (“Atendidas as peculiaridades locais, o termo circunstanciado poderá ser lavrado pela Polícia Civil ou Militar“) e ainda o amplia para “outros órgãos da segurança pública”, como é o caso da Polícia Rodoviária Federal, que já vem lavrando Termos Circunstanciados de Ocorrência nas infrações de menor potencial ofensivo desde que aprovado pelo Ministério da Justiça o PARECER n. 00671/2019/CONJUR-MJSP/CGU/AGU (Veja o Parecer na íntegra: PARECER 00671-2019-CONJUR-MJSP-CGU-AGU).
Em 26 de dezembro de 2016, ASSOCIAÇÃO DOS DELEGADOS DE POLÍCIA DO BRASIL (ADEPOL) ajuizara no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.637), contestando o artigo 191 da Lei Estadual (MG) nº 22.257/2016, que, ainda que no processo legislativo tivesse sido vetado pelo Governador, passou a viger em razão de a Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no dia 08 de dezembro de 2016, derrubar tal veto (“Art. 191 – O termo circunstanciado de ocorrência, de que trata a Lei Federal nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, poderá ser lavrado por todos os integrantes dos órgãos a que se referem os incisos IV e V do caput do art. 144 da Constituição da República”). O resultado veio em 11 de março de 2022 quando, no julgamento dessa ADI 5.637-MG o Pleno do Supremo Tribunal Federal assim decidiu: “O Tribunal, por unanimidade, declarou a constitucionalidade da Lei do Estado de Minas Gerais n. 22.257, de 27 de julho de 2016, e, por consequência, julgou improcedente a presente ação direta, nos termos do voto do Relator. Plenário, Sessão Virtual de 4.3.2022 a 11.3.2022.” (Leia na íntegra: Acórdão ADI 5.637-MG)
Finalmente, no dia 22 de fevereiro de 2023, foram julgadas em conjunto as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs 6.245 e 6.264, ajuizadas pela ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS DELEGADOS DE POLÍCIA JUDICIÁRIA (ADP), e o Tribunal, por unanimidade, as julgou improcedentes e, ainda, fixou a seguinte tese:
“O Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) não possui natureza investigativa, podendo ser lavrado por integrantes da polícia judiciária ou da polícia administrativa“.
A importância desta última ADI é que, diferentemente de outras anteriores, além do efeito pedagógico da tese firmada, vale lembrar que esta decisão tem efeito vinculante para todos os órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública, nos exatos termos postos pelo artigo 102, § 2º, da Constituição da República (“As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.“).
Para o Instituto Brasileiro de Segurança Pública (IBSP) este é um tema dos mais preciosos para a verdadeira mudança na concepção das políticas públicas voltadas para segurança cidadã no Brasil, porque vai ao encontro dos princípios que orientam a Lei dos Juizados Especiais em busca de uma justiça qualificada e célere, capaz de mitigar a impunidade, propiciar o “não encarceramento”, pela adoção de penas alternativas (penas restritivas de direito e pecuniárias em caráter substitutivo às penas privativas de liberdade), acolher de forma eficaz a vítima e promover uma verdadeira integração entre as agências policiais (polícia judiciária e polícia de segurança), investir num modelo de devido processo legal baseado critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação, evitando os riscos da chamada “espiral da violência” e reservando – por fim – as energias das polícias civis e federal para o combate à criminalidade organizada e violenta.
Mas as ações do IBSP não se restringiram, na defesa do tema ao longo de seus mais de 5 anos de fundação, em publicar boas notícias como esta; confira-se a Conferência Nacional – Termo Circunstanciado de Ocorrência promovida em 2021 (Acesse aqui) e a disponibilização do Manual de Apoio Jurídico-operacional do Termo Circunstanciado (Download aqui).
Azor Lopes da Silva Júnior, Prof. Dr.
Presidente do Conselho Deliberativo do IBSP
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6088271460892546
redação
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As vítimas não querem saber quem tem maior autoridade, elas querem é serem atendidas o quanto antes. Justa decisão.
Excelente para todos os interessados em prestar um serviço de segurança pública com qualidade e objetividade. A sociedade irá sentir os resultados positivos.