A CENTÉSIMA PRIMEIRA EMENDA À CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

Azor Lopes da Silva Júnior[1]

A proibição de acumulação, empedernida à realidade de um novo momento representa um anacronismo se entendermos que a educação e a saúde não podem prescindir dos melhores e mais qualificados profissionais. A educação, semente do germinar de um povo livre e do alvorecer de uma nação independente não deve estar atada a obstáculos formais, pois a sua causa plural assume contornos majestosos.” (Justificação apresentada na PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 215, DE 2003. Sala das Sessões, em 24 de novembro de 2003. Deputado Alberto Fraga).

Abrindo caminho para a segunda centena, no dia 03 de julho de 2019 o Congresso Nacional promulgou como Emenda Constitucional nº 101, a Proposta de Emenda à Constituição nº 215, de autoria do então Deputado Alberto Fraga e por ele apresentada em 24 de novembro de 2003.

A PEC 215/2003 trazia como proposta a inclusão de um terceiro parágrafo ao artigo 42 da Constituição Federal: “Aplica-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios a vedação constante do art. 37, exceto quando além da compatibilidade de horários a acumulação com o cargo militar for um de professor, um técnico ou científico ou um cargo privativo de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas”. (Clique aqui e veja o texto original: PEC-215-2003-Texto original Alberto Fraga).

Ao longo do processo legislativo próprio das propostas de emenda constitucional (dois turmos de discussão e votação com aprovação de maioria qualificada: 3/5 dos membros das duas Casas do Congresso Nacional), sofrendo mutação do que restou ao final assim promulgado: “Aplica-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios o disposto no art. 37, inciso XVI, com prevalência da atividade militar”. (Clique aqui e veja o texto final publicado: DOU-EC 101-2019).

Note-se que a redação final ficou mais “enxuta” e de boa técnica legislativa, porque ao fazer remissão ao inciso XVI do artigo 37 mostrou-se sistêmica, como se exige de qualquer norma, notadamente quando se trata de uma norma constitucional; isso porque o texto de remissão já cuidava de dizer que seria vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, a de dois cargos de professor, a de um cargo de professor com outro técnico ou científico e, por fim, a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas.

Antes disso, a regra constitucional era clara e taxativa: “o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea “c”, será transferido para a reserva, nos termos da lei;” (Art. 142, § 3º, II); agora não mais.

Além de tantas vedações aplicadas aos militares estaduais; em nossa CONSTITUIÇÃO FEDERAL INTERPRETADA (10ª ed [1ª ed. 2009]) São Paulo: Manole Editores, 2019)[2] já apontávamos:

O art. 14, § 8º, assegura ao militar ser alistável e elegível, mas lhe impõe tratamento mais restritivo que aos demais cidadãos, não se lhes permitindo o exercício da função e a filiação partidária (ver art. 142, § 3º, V, desta Constituição), essa que é pressuposto da elegibilidade (ver art. 14, § 3º, V, desta Constituição), menos ainda a acumulação da função militar e mandato eletivo, que ao servidor público civil é possível, observadas as regras do art. 38, como também se lhes veda a filiação partidária (ver comentário ao art. 142, § 3º, V); a acumulação de cargo público também lhe é considerada incompatível com sua função, gerando sua transferência para a reserva se tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente (ver comentário ao art. 142, § 3º, II), e passando a condição de agregado se tal função pública civil, ainda que da Administração indireta, for temporária (ver comentário ao art. 142, § 3º, III); anote-se que o próprio texto constitucional originário, no art. 17 do ADCT, já havia estendido a cumulatividade aos ‘profissionais de saúde’ (§ 2º), bem como aos médicos militares, todavia, a EC n. 18/98 acrescentou a regra do inciso II do § 3º do art. 142, impedindo a cumulatividade de cargos públicos aos militares, alcançando os médicos militares, que, por essa razão, estavam impedidos de cumular outra função pública, até que sobreveio a EC n. 77, de 11.02.2014, inovando no art. 142, § 3º, II, da CF: ‘ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea c, e assim permitindo o acúmulo de função à categoria’ […]”.; “O texto original da CF/88 acompanhou as redações das Cartas Constitucionais anteriores que, desde a EC n. 20/66, que alterou o art. 185 da CF de 1946, passou a permitir a acumulação de cargos públicos de médicos. A forte pressão política, especialmente dos Conselhos Regionais e Conselho Nacional de Odontologia, motivou a nova redação por intermédio da EC n. 34, de 13.12.2001, alargando a possibilidade de acumulação a todos os profissionais de saúde, cujas profissões sejam regulamentadas por respectivos conselhos (Conselho Federal de Medicina, Conselho Federal de Enfermagem, Conselho Federal de Farmácia, Conselho Federal de Medicina Veterinária, Conselho Federal de Nutricionistas, Conselho Federal de Psicologia, Conselho Federal de Técnicos em Radiologia, Conselho Federal de Fonoaudiologia, Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional e Conselho Federal de Odontologia). Ainda, é de se anotar que o próprio texto constitucional originário, no art. 17 do ADCT, já havia estendido a cumulatividade aos ‘profissionais de saúde’ (§ 2º) bem como aos médicos militares. No que toca aos últimos, é de se lembrar, todavia, que a EC n. 18/98 acrescentou a regra do inciso II do § 3º do art. 142, impedindo a cumulatividade de cargos públicos aos militares, categoria especial na qual se acham os facultativos (médicos) militares que, por essa razão, estavam impedidos de cumular outra função pública, até que sobreveio a EC n. 77, de 11.02.2014, inovando no art. 142, § 3º, II, da CF: ‘ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea c, e assim permitindo o acúmulo de função à categoria’. Em 27.04.2017, ao julgar os Recursos Extraordinários nº 602.043 e 612.975, o Plenário do STF, reconhecendo a repercussão geral do tema, assentou que, nos casos de acumulação de cargos públicos autorizados pela Constituição, deve ser aplicado o teto remuneratório constitucional de forma isolada para cada um desses cargos.

De qualquer forma, já dizíamos que a remuneração percebida dos cofres públicos fica limitada ao teto salarial do funcionalismo público; nesse sentido, mais uma vez vale trazer nossa CONSTITUIÇÃO FEDERAL INTERPRETADA:

De qualquer forma, sendo possível, dentro das exceções exaustivamente enumeradas, a acumulação de proventos e vencimentos ou subsídios, a este montante se imporá o limite previsto no inciso XI deste artigo (teto salarial do funcionalismo público), nos termos do § 11 do art. 40 desta Constituição, bem como também é vedada a acumulação de mais de um provento de aposentadoria (ver comentário ao § 6º do art. 40 desta Constituição), exceto tratando-se de proventos resultantes de cargos acumuláveis na atividade. Vale aproveitar como precedente aplicável à acumulação de proventos, a mesma lógica empregada pelo STF ao julgar os Recursos Extraordinários ns. 602.043 e 612.975, em que o Plenário decidiu que, nos casos de acumulação de cargos públicos autorizados pela Constituição, deve ser aplicado o teto remuneratório constitucional de forma isolada para cada desses cargos.”.

Finalmente, é necessário aqui render as homenagens do nosso Instituto Brasileiro de Segurança Pública (IBSP) especialmente ao autor da proposta original: o ex-Deputado Federal brasiliense ALBERTO FRAGA; mas quem é ele?

Seu nome de batismo é JOÃO ALBERTO FRAGA SILVA, um sergipano filho de Pedro da Silva Sobrinho e Joana Vieira Fraga e Silva, nascido em 02 de junho de 1956. Em 1974, aos 18 anos de idade, iniciou sua carreira no oficialato da Polícia Militar do Distrito Federal até que passou para a reserva quando eleito, diplomado e empossado no cargo de Deputado Federal em 1999, exercendo até 31 de janeiro de 2019 mandatos consecutivos por 20 anos.

Parabéns!!! 16 anos se passaram, mas a ideia se transformou em realidade e mudou a antiga realidade para melhor. Ao contrário de se verem obrigados a se esgueirarem nas sombras da ilegalidade ou ocuparem subempregos, a partir de agora, duas profissões que se assemelham ao sacerdócio e ao sacrifício podem ser encarnadas num mesmo homem ou mulher militar estadual: a de policial militar e a de professor.

Fraga,

Quem se entrega à educação cria vidas e alimenta os sonhos; quem protege essas vidas permite que os sonhos sejam sonhados e que aconteçam…” (Azor).

Obrigado!!!

Notas

[1] Pós-doutorando, pesquisador de “Hermenêutica e Positivismo Jurídico” pela Unesp, Doutor em Sociologia (Unesp), Mestre (Universidade de Franca) e Especialista (Unesp) em Direito. Advogado, Professor Universitário (UNIRP) e Presidente do Instituto Brasileiro de Segurança Pública (ibsp.org.br). Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6088271460892546.

[2] A obra tem como Organizador ANTÔNIO CLÁUDIO DA COSTA MACHADO e como Coordenadora ANNA CANDIDA DA CUNHA FERRAZ, ambos professores da tradicional Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP), e como autores 36 de seus ex-alunos egressos de programas de pós-graduação “stricto sensu”, encarregados de produzir suas 1.407 páginas; adquira a obra em: https://www.amazon.com.br/Constitui%C3%A7%C3%A3o-Federal-interpretada-artigo-par%C3%A1grafo/dp/8520459048/ref=sr_1_1?gclid=CjwKCAjwx_boBRA9EiwA4kIELg3n5P4iAdBys5vQ1nuWnGDila4pMbXWtp-gI4aVXnkOxJCkqsnYHhoCeiEQAvD_BwE&hvadid=326924803180&hvdev=c&hvlocphy=1001771&hvnetw=g&hvpos=1t1&hvqmt=b&hvrand=6147238020104724846&hvtargid=kwd-338971750028&keywords=constitui%C3%A7%C3%A3o+federal+interpretada&qid=1562286863&s=gateway&sr=8-1

Ou ainda em: https://www.manole.com.br/constituicao-federal-interpretada-10-edicao/p

 

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