RECOMENDAÇÃO EXPEDIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO É OBJETO DE REPRESENTAÇÃO NO CNMP

A “ASSOCIAÇÃO DOS OFICIAIS MILITARES DO ESTADO DE SÃO PAULO EM DEFESA DA POLÍCIA MILITAR – DEFENDA PM”, protocoliza Representação em face do Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo perante o Conselho Nacional do Ministério Público (Documento 01.008200/2018), em defesa das atribuições de polícia judiciária militar.

Abaixo, com a anuência da Diretoria Executiva da “DEFENDA PM”, segue a transcrição da petição inicial em sua íntegra:

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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

 

“De qualquer forma, o acórdão recorrido está alinhado à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que ‘a Justiça Militar dirá, por primeiro, se o crime é doloso ou não; se doloso, encaminhará os autos do inquérito policial militar à Justiça comum. Registre-se: encaminhará os autos do inquérito policial militar. É a lei, então, que deseja que as investigações sejam conduzidas, por primeiro, pela Polícia Judiciária Militar’ (trecho do voto do Min. Carlos Velloso na ADI 1.494 MC, Rel. Min. Celso de Mello). […]” (STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO 804.269-SP. Relator Ministro ROBERTO BARROSO. Julgado em 24 de março de 2015).

 

“Sr. Presidente, a meu ver, o § 2º do art. 82 da Lei nº 9.299, de 07.08.1996, impõe a instauração de inquérito policial militar sempre que houver suspeita de que um militar haja praticado crime doloso contra a vida de civil. […] Boa ou má, foi uma opção do legislador que não considero inconstitucional”. (ADI nº 1.494-3/MC/DF, Voto Ministro SYDNEY SANCHES, julgado em 09 de abril de 1997).

 

“[…] a Polícia Civil não pode instaurar, no caso inquérito. O inquérito ocorrerá por conta da Polícia Judiciária Militar, mediante inquérito policial militar. Concluído o IPM, a Justiça Militar decidirá, remetendo os autos à Justiça comum, se reconhecer que se trata de crime doloso praticado contra civil”. (ADI nº 1.494-3/MC/DF, Voto Ministro CARLOS VELLOSO, julgado em 09 de abril de 1997).

 

ASSOCIAÇÃO DOS OFICIAIS MILITARES DO ESTADO DE SÃO PAULO EM DEFESA DA POLÍCIA MILITAR – DEFENDA PM”, inscrita no CNPJ/MF sob nº 26.124.914/0001-58, entidade de classe sem fins econômicos, de âmbito estadual, apartidária, de caráter civil, com tempo de duração indeterminado, dotada de personalidade jurídica de direito privado, de caráter associativo, com foro e sede na Rua XV de Novembro, nº 3171, sala 83, CEP 15015-110, na cidade de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo, no exercício de sua legitimação e obrigações estatutárias[1] (Doc. 01), representada por seu Advogado e bastante procurador (Procuração inclusa), contando com poderes especiais, e que ao final subscreve, vem à presença de Vossa Excelência para, nos termos do disposto no artigo 130-A, § 2º, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil[2], e artigos 2º, inciso II, e 118 do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público (Resolução 92, de 13 de março de 2013)[3], representar contra ação ou omissão do Excelentíssimo Senhor PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por ato de seu o Centro de Apoio Criminal (CAOCrim), consistente em publicizar orientação[4] (Doc. 02) daquela instância superior da instituição para que os Senhores Promotores de Justiça do Estado expeçam, no limite de suas atribuições funcionais, “RECOMENDAÇÃO” às Delegacias Seccionais de Polícia e aos Comandos da Polícia Militar de suas respectivas Comarcas “a fim de evitar problemas processuais e atrasos na apuração dos fatos supostamente criminosos”, considerando – segundo seu entendimento – que “a competência jurisdicional da Justiça Militar Estadual para os crimes militares praticados contra civis não abrange os dolosos contra a vida quando a vítima for civil, nos termos do § 4º do art. 125 na redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/04”, por concluir quese compete à Justiça Comum o processamento dos crimes dolosos contra a vida de civil praticados por militar porque não constituem infrações militares, por certo não cabe à Polícia Militar sua investigação, sendo reservada a essa tão somente a investigação das infrações militares”, em flagrante afronta ao disposto na norma constitucional (Art. 144, § 4º, parte final)[5] e legal (Art. 82, § 2º, Código de Processo Penal Militar)[6], bem assim à jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, a pretexto de antecipar-se, e assim por expectativa, usurpar futura e ainda incerta decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em sede de controle de constitucionalidade em face da Constituição Estadual (Processo nº 2166281-19.2017.8.26.0000)[7]. Da abstração digital (Doc. 02) a Recomendação ganhou efeitos concretos (Doc. 03).

DOS FATOS

Afirma-se, no ato enunciativo impugnado nesta Representação e naquele dele concretamente decorrente (Doc. 03), que:

[…] enquanto perdurar a suspensão liminar da Resolução nº 54, de 18 de agosto de 2017:

1- Os respectivos procedimentos para se apurar tais mortes são da competência da Justiça Comum Estadual da comarca na qual funciona o Tribunal do Júri;

2- As atribuições para conduzir as investigações, procedendo a todos os atos é exclusiva da Polícia Civil de São Paulo; […]

6- Qualquer descumprimento ou não atenção ao disposto na Resolução 40, de 24 de março de 2015 da Secretaria de Segurança Pública, deverá ser imediatamente comunicada à Promotoria de Justiça Criminal de ……………………………., que detém a atribuição de Controle Externo da Atividade Policial e/ou atribuição em crime doloso contra a vida;

 

Impõe-se uma breve síntese da recente história: por meio da Resolução nº 40 (Doc. 04)[8], em 24 de março de 2015 a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo normatizou que em casos de morte decorrente de intervenção policial, estando ou não o agente em serviço, as medidas preliminares de registro da infração penal estariam afetas exclusivamente ao Delegado de Polícia da circunscrição e comunicadas ao Ministério Público.

O tema já fora objeto de anteriores e semelhantes Resolução da mesma pasta (Resolução SSP 110, de 2010, Doc. 05, e Resolução SSP 45, de 2011), adiante julgada inconstitucional pelo Pleno do Egrégio Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, em acórdão assim ementado (Doc. 06):

“POLICIAL MILITAR – Conteúdo normativo da Resolução SSP 110, de 19.07.10 reconhecido – Observância da reserva de plenário nos termos do art. 97, da Constituição Federal – A Lei 9.299/96 e a EC nº 45/04 apenas deslocaram a competência para o Júri, para processar e julgar crimes militares dolosos contra a vida, com vítimas civis – Manutenção da natureza de crime militar (art. 9º, CPM) impõe a aplicação do § 4º, do art. 144, do CPM – Competência exclusiva da polícia judiciária militar para a condução da investigação – Inconstitucionalidade reconhecida da Resolução SSP 110, de 19.07.10 – Decisão unânime.” (TJM/SP. ADI 001/10. Relator Juiz PAULO ADIB CASSEB, julgado 03.12.10).

 

Merece registro histórico nova decisão do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, havida no dia 21 de junho de 2017, nos autos HABEAS CORPUS Nº 0001389-46.2017.9.26.0000, tendo como impetrante o Dr. ELIAS MILER DA SILVA, paciente o então Capitão PM MÁRCIO CORTEZ MAYA GARCIA e autoridade coatora o Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo, em que se buscava salvo-conduto em face de Inquérito Policial Civil nº 401/2017, onde se lhe imputava suposta “usurpação da função pública”, por haver adotado providências de polícia judiciária militar nos termos do Código de Processo Penal Militar, porém em desacordo com as sobreditas resoluções secretariais. Na ocasião, bem assentou o Relator, Juiz ORLANDO EDUARDO GERALDI, resolvendo de plano a preliminar suscitada que “em se tratando de meras atualizações da Resolução SSP 110/2010, cuja inconstitucionalidade já foi declarada por esta Corte, reconheço a inconstitucionalidade das Resoluções SSP nº 45/2011 e nº 40/2015”. Essa ação constitucional mandamental restou decidida pelo Pleno da Corte (Doc. 07) e ementada nos seguintes termos:

HABEAS CORPUS PREVENTIVO. Concessão do pedido liminar. Ausência de justa causa para instauração de IPM para apurar a conduta do paciente. Preliminar de inconstitucionalidade das Resoluções SSP 110/2010, 45/2011 e 40/2015. Inconstitucionalidade reconhecida das Resoluções 45/2011 e 40/2015. Ordem concedida. 1. As alterações legislativas ocorridas com a edição da Lei nº 9.299/96, sobremodo no art. 9º do CPM e no art. 82 do CPPM, de modo algum modificaram a natureza militar dos crimes dolosos contra a vida praticados por policial militar contra civil. Inteligência do art. 82, § 2º, do CPPM. 2. Inconstitucionalidade reconhecida da Resolução SSP 110, de 19.7.10, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 01/10. 3. Resoluções SSP 45/2011 e 40/2015 tratam-se de meras atualizações da Resolução SSP 110/2010 já declarada inconstitucional. 3. Reconhecimento da inconstitucionalidade da Resolução SSP-45, de 6/4/2011 e da Resolução SSP-40, de 24/3/2015, ambas da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. 4. Ordem concedida em definitivo, confirmando a liminar anteriormente deferida. 5. Expedição de salvo conduto.

 

Desse histórico desdobrou-se que aquela Egrégia Corte Castrense editou a RESOLUÇÃO Nº 54, DE 18 DE AGOSTO DE 2017 (Doc. 08), reafirmando as atribuições de polícia judiciária militar afetas às autoridades policiais militares e determinando-se-lhes obediência[9].

Dez dias após sua edição, Sua Excelência o Procurador-Geral de Justiça, Dr. GIANPAOLO POGGIO SMANIO, protocoliza contra a norma a AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ESTADUAL) nº 2166281-19.2017.8.26.0000 (Doc. 09), cuja liminar foi concedida, suspendendo-se sua eficácia[10] até final julgamento ainda pendente (Doc. 10).

Diante desse quadro, o Centro de Apoio Criminal (CAOCrim), órgão subordinado à autoridade Representada, disseminou pelo Website do Ministério Público Estadual um “modelo de Recomendação”[11] destinado a que os Promotores de Justiça Criminal do Júri e/ou do Controle Externo da Polícia Judiciária, elaborem recomendações à Delegacia Seccional de Polícia e ao Comando da Polícia Militar de sua Comarca, “a fim de evitar problemas processuais e atrasos na apuração dos fatos supostamente criminosos”, não sem deixar de advertir que seriam “passíveis de eventual responsabilização por qualquer ação ou omissão apta a contrariar os termos aqui expostos”.

 

DO DIREITO: A “CAUSA PETENDI”

Determina o artigo 118 do Regimento Interno desse Egrégio CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO que “Caberá reclamação para preservar a competência do Conselho ou garantir a autoridade de suas decisões plenárias”.

A causa de pedir reside no fato de que o ato ora impugnado não atende ao comando da RESOLUÇÃO CNMP N° 164, DE 28 DE MARÇO DE 2017 (Doc. 11), que disciplina a expedição de Recomendações, notadamente de seus artigos[12] 3º, 5º e 6º, que impõe seu nascedouro à preexistência de inquérito civil, de procedimento administrativo ou procedimento preparatório, com a ressalva do disposto no seu parágrafo segundo, descabendo sua expedição em casos “sub judice”.

Assim, o objeto dessa Representação ainda que tenha outra “quaestio juris” como de fundo, com ela não se confunde, posto que aqui a causa de pedir é o excesso do Ministério Público do Estado de São Paulo no exercício de seu legítimo poder-dever de controle externo da atividade policial, do que se desdobra a edição de atos administrativos formalizados como “Recomendações”, tendo por fundamento – entre outras normas federais e estaduais de hierarquia superior e inferior, todas com assento constitucional – no artigo 4º, IX[13], da Resolução CNMP nº 20, de 28 de maio de 2007.

Com efeito, ainda que as Recomendações do Ministério Público sejam atos administrativos legítimos, não se pode negar seu caráter meramente enunciativo, assim desprovidos dos atributos da imperatividade[14] e da autoexecutoriedade[15]; ademais, não estão imunes ao princípios republicanos adotados pela Carta Constitucional, dentre os quais ocupa posição suprema o princípio da legalidade e, logo adiante, o da separação dos poderes. Destaque-se que no caso, o ato impugnado reveste-se de um tom coercitivo, na medida em que assenta:

“vem expor, através deste ato formal de natureza preventiva, as razões fáticas e jurídicas abaixo elencadas, o que faz não só com a finalidade de orientação e advertência, mas também para evitar futura alegação de desconhecimento de seu conteúdo ou até mesmo irregularidade de conduta (configuradora do elemento subjetivo – dolo).” (grifei).

 

Diz a doutrina de Mazzilli que, a par dessas características, as Recomendações geram obrigações aos seus destinatários, o que por si implica equilíbrio, sensatez, cautela e precauções quanto à sua legalidade e razoabilidade por parte de quem as subscreve:

“Embora as recomendações, em sentido estrito, não tenham caráter vinculante, isto é, a autoridade destinatária não esteja juridicamente obrigada a seguir as propostas a ela encaminhadas, na verdade têm grande força moral, e até mesmo implicações práticas. Com efeito, embora as recomendações não vinculem a autoridade destinatária, passa esta a ter o dever de: a) dar divulgação às recomendações; b) dar resposta escrita ao membro do Ministério Público, devendo fundamentar sua decisão. (MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1996.).

 

DO DIREITO: A MATÉRIA DE FUNDO

Quanto ao tema de fundo sobre o que ora se discute, registre-se que é conhecido o posicionamento dessa Procuradoria-Geral da República a partir do r. PARECER trazido aos autos da AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.804-RJ em 28 de agosto de 2018 (Doc. 12), ainda que, respeitosamente, não o acolhamos como o melhor entendimento, pelo que vale fundamentar.

O ato impugnado pretende legitimar seus fundamentos, dando-lhe ares de legalidade, em hipóteses de duvidosa lógica e, certamente, que não encontram supedâneo na Constituição da República, em normas infraconstitucionais, em Súmulas Vinculantes ou Súmulas dos Tribunais Superiores, tampouco em jurisprudência pacificada ou objeto de repercussão geral; senão vejamos um a um e suas respectivas fragilidades:

ARGUMENTO 1

“[…] vem recebendo notícias de que, por todo o estado, em casos envolvendo mortes de civis pela Polícia Militar, os próprios policiais militares estão tomando providências de competência exclusiva da Polícia Judiciária, tais como apreensão de armas, alteração da cena dos fatos, oitivas de envolvidos e testemunhas, dentre outras diligências elucidativas” […].

ARGUMENTO 2

“[…] a competência jurisdicional da Justiça Militar Estadual para os crimes militares praticados contra civis não abrange os dolosos contra a vida quando a vítima for civil, nos termos do § 4º do art. 125 na redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/04” […].

ARGUMENTO 3

“se compete à Justiça Comum o processamento dos crimes dolosos contra a vida de civil praticados por militar porque não constituem infrações militares, por certo não cabe à Polícia Militar sua investigação, sendo reservada a essa tão somente a investigação das infrações militares”.

 

O “ARGUMENTO 1” (“competência exclusiva da Polícia Judiciária”) sucumbe ao ditame constitucional do artigo 144, § 4º, parte final, que deveria remeter o bom hermeneuta ao verdadeiro conceito jurídico de “crime militar” (seja ele próprio ou impróprio) dado pelo artigo 9º do Código Penal Militar[16], que ainda recentemente com a promulgação da Lei nº 13.491, de 2017, manteve a natureza de “crime militar” e sob a jurisdição castrense, mesmo aqueles dolosos contra a vida de civis quando cometidos por militares das Forças Armadas.

O bom hermeneuta deveria sintonizar esses conceitos com as normas processuais previstas no Código de Processo Penal Militar, que definem as atribuições e as autoridades competentes para o exercício de uma categoria especial de também “polícia judiciária”: a polícia judiciária militar[17].

Esse mesmo bom hermeneuta deveria concatenar esses comandos normativos de menor hierarquia às mais elevadas normas de matriz constitucional que, reafirmando o princípio do juiz natural, fixam a competência da Justiça Militar da União[18] e dos Estados[19], nesta com as ressalvas de (1) somente julgar militares do Estado e (2) quando a vítima do ilícito for civil a competência ser acometida ao Juiz Militar togado ou ao Tribunal do Júri.

Por todo esse singelo encadeamento normativo deveria restar evidente ao bom hermeneuta que nem a Lei nº 9.299, de 1996, ou a superveniente Emenda Constitucional nº 45, de 2004, tampouco a “novatio” Lei nº 13.491, de 2017, revogaram o artigo 205 do Código Penal Militar[20] ou lhe retiraram a natureza de crime militar (ainda que impróprio como sempre o definiu a boa doutrina).

O “ARGUMENTO 2” (“competência jurisdicional da Justiça Militar Estadual para os crimes militares praticados contra civis não abrange os dolosos contra a vida quando a vítima for civil”) peca por sua obviedade, pois que ninguém em sã consciência ousaria atribuir à norma constitucional – diria-se – uma “interpretação disforme” (neologismo aqui tomado por recurso estilístico pleonástico); entretanto, isso não permite entender, como querem alguns e como o faz o ato impugnado a partir de seu malfadado e falacioso “ARGUMENTO 3” (“se compete à Justiça Comum o processamento dos crimes dolosos contra a vida de civil praticados por militar porque não constituem infrações militares, por certo não cabe à Polícia Militar sua investigação”).

Esse é o argumento mais comum e ao mesmo tempo mais frágil, o que justifica falar-se no contraste do senso comum com o pensar científico a partir do filósofo francês GASTON BACHELARD:

A ciência, tanto por sua necessidade de coroamento como por princípio, opõe-se absolutamente à opinião. Se, em determinada questão, ela legitimar a opinião, é por motivos diversos daqueles que dão origem à opinião; de modo que a opinião está, de direito, sempre errada. A opinião pensa mal; não pensa: traduz necessidades em conhecimentos. Ao designar os objetos pela utilidade, ela se impede de conhecê-los. Não se pode basear nada na opinião: antes de tudo, é preciso destruí-la. Ela é o primeiro obstáculo a ser superado. Não basta, por exemplo, corrigi-la em determinados pontos, mantendo, como uma espécie de moral provisória, um conhecimento vulgar provisório. O espírito científico proíbe que tenhamos uma opinião sobre questões que não compreendemos, sobre questões que não sabemos formular com clareza (BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Tradução: Estela S. Abreu. 1. ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996, p. 18).

 

Talvez fosse até mesmo despiciendo recorrer à filosofia e à epistemologia para ferir de morte o “ARGUMENTO 3” (“se compete à Justiça Comum, por certo não cabe à Polícia Militar sua investigação”), quando a própria lei impõe a interpretação literal[21] das normas processuais penais militares e seu artigo 82 – cuja redação fora renovada pela Lei nº 9.299, de 1996, e se acha em plena sintonia com o que mais adiante fora trazido ao patamar mais elevado pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004 – além de gravar seu caráter de norma especial, ainda expressamente afirma:

 

Art. 82. O foro militar é especial, e, exceto nos crimes dolosos contra a vida praticados contra civil, a ele estão sujeitos, em tempo de paz: […]

§ 2° Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça comum. (grifei).

 

A partir do mero pressuposto de alfabetização na língua pátria, qual dúvida se admite emergir da leitura do texto normativo (“a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça comum”), quando ele é expresso em afirmar que (i) deverá haver a instauração de Inquérito Policial Militar e (ii) a Justiça Militar é quem enviará esse procedimento dispensável de polícia judiciária à Justiça comum, mesmo nos casos de crimes dolosos contra a vida de civil e quando o sujeito ativo for policial militar o bombeiro militar.

E se a literalidade normativa ainda necessitasse de tradução, veja-se que nossa Suprema Corte, tanto em decisão recente (2015) quanto em já antiga que restou renovada (1997), assim decidiu:

“De qualquer forma, o acórdão recorrido está alinhado à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que ‘a Justiça Militar dirá, por primeiro, se o crime é doloso ou não; se doloso, encaminhará os autos do inquérito policial militar à Justiça comum. Registre-se: encaminhará os autos do inquérito policial militar. É a lei, então, que deseja que as investigações sejam conduzidas, por primeiro, pela Polícia Judiciária Militar’ (trecho do voto do Min. Carlos Velloso na ADI 1.494 MC, Rel. Min. Celso de Mello). […]” (STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO 804.269-SP. Relator Ministro ROBERTO BARROSO. Julgado em 24 de março de 2015).

“[…] não vejo inconstitucionalidade no texto da lei que, embora havendo qualificado como da competência da Justiça comum crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil por policial militar, haja, todavia, determinado que essa fase preliminar do inquérito se faça no âmbito da própria Justiça Militar” (ADI-MC nº 1.494-3/DF, Voto Ministro NÉRI DA SILVEIRA, julgado em 09 de abril de 1997).

“Sr. Presidente, a meu ver, o § 2º do art. 82 da Lei nº 9.299, de 07.08.1996, impõe a instauração de inquérito policial militar sempre que houver suspeita de que um militar haja praticado crime doloso contra a vida de civil. […] Boa ou má, foi uma opção do legislador que não considero inconstitucional”. (ADI-MC nº 1.494-3/DF, Voto Ministro SYDNEY SANCHES, julgado em 09 de abril de 1997).

“[…] a Polícia Civil não pode instaurar, no caso inquérito. O inquérito ocorrerá por conta da Polícia Judiciária Militar, mediante inquérito policial militar. Concluído o IPM, a Justiça Militar decidirá, remetendo os autos à Justiça comum, se reconhecer que se trata de crime doloso praticado contra civil”. (ADI-MC nº 1.494-3/DF, Voto Ministro CARLOS VELLOSO, julgado em 09 de abril de 1997).

 

Por amor ao debate verdadeiramente científico, merece destaque o voto vencido de Sua Excelência o Ministro CELSO DE MELLO, Relator da emblemática Medida Cautelar na supracitada AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 1.494-3/DF, pois que chega a argumentar, porém sem sucesso:

“Como sabemos, os crimes cometidos por policiais militares, em serviço de policiamento ostensivo, foram quase sempre tradicionalmente qualificados como delitos sujeitos à competência penal da Justiça comum. Foi por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, ao enunciar a Súmula 297, firmou orientação jurisprudencial no sentido de que ‘Oficiais e praças das milícias dos Estados, no exercício de função policial civil, não são considerados militares para efeitos penais, sendo competente a Justiça Comum para julgar os crimes cometidos por ou contra eles’.” (Voto Vencido).

Malgrado outras questões de fundo ideológico que podem ter inspirado o voto sempre erudito de Sua Excelência, desta feita não se orientou com o costumeiro acerto jurídico o letrado Decano, porque partiu de uma falsa premissa histórica (“os crimes cometidos por policiais militares, em serviço de policiamento ostensivo, foram quase sempre tradicionalmente qualificados como delitos sujeitos à competência penal da Justiça comum”) para justificar o advento da Súmula 297.

A verdade ocultada para tentar impor o argumento falacioso é de que a Súmula 297 se prestava a afastar da jurisdição militar os casos em que policiais militares atuavam como comissionados à disposição da Polícia Civil, mas não quando “em serviço de policiamento ostensivo”.

Basta tomar um dos precedentes que lhe deu causa – Habeas Corpus nº 39.945-RS – relatado pelo saudoso Ministro PEDRO CHAVES, em 19 de julho de 1.963 e publicado na RTJ 31/341 restou assim ementado: “Soldado da Polícia Militar, à disposição da autoridade civil, para o exercício de função civil, não é militar nem assemelhado, e responde pelo crime praticado nessas circunstâncias, perante a justiça comum”; tratava-se de peculato praticado por miliciano que prestava serviços no fórum à disposição da autoridade judicial.

Noutro precedente que deu origem à edição da súmula – o Conflito de Jurisdição nº 2.623-RS, julgado em 24 de maio de 1.963 sob relatoria do Ministro GONÇALVES DE OLIVEIRA, – o acusado era policial militar cedido à disposição da delegacia de polícia civil, onde prestava serviços internos de apoio burocrático e, assim, a própria Justiça Militar declinou de sua competência; já no Conflito de Jurisdição nº 2.698, julgado em 06 de julho de 1.962, também pelo Ministro GONÇALVES DE OLIVEIRA, o parecer do Procurador JOSÉ NAUFÉL e aprovado pelo Procurador-Geral da República EVANDRO DE LINS E SILVA, assentou com uma didática que, infelizmente, não se vê nem se aprende nos tempos modernos:

“A conclusão é a de que sempre que estiver servindo ao destacamento policial-militar, com função militar, sob comando militar e sujeito à disciplina militar, o oficial e praça das polícias militares hão de ser considerados militares para efeito de incidência da lei penal militar. Quando, porém, estiverem servindo em dependência civil, com função e sob chefia civil, perdem, para esse efeito, a qualidade de militares”.

 

Essa é a verdadeira origem da Súmula 297 do Supremo Tribunal Federal enquanto não fora revogada a partir da promulgação da Emenda Constitucional 7/77, como restou adiante ementado no julgamento do RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 56.049, julgado em 1978 e incorporado ao HABEAS CORPUS Nº 69.571, julgado em 25 de agosto de 1992:

  1. “Superação da súmula após a Emenda Constitucional 7/77 e manutenção desse entendimento na atual Constituição Federal.
  2. A distinção acolhida pelo Tribunal local – que a Súm. 297, sob a Constituição de 1946, consagra -, reputou-se superada, desde a EC 7/77, no que toca aos crimes militares praticados por policiais militares, tal como se firmou no RHC 56.049, 13.6.78, RTJ 87/47, da lavra do saudoso Ministro Alckimin.
  3. A Constituição de 1988, no art. 125, § 4º, manteve a inovação da reforma de 1977, que levou à alteração da jurisprudência”.

(STF. HC 69.571, Relator: Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, 1ª Turma, DJ de 25 de setembro de 1.992).

 

Excelentíssima Senhora Presidente do Egrégio

Conselho Nacional do Ministério Público,

Excelentíssimo Senhores Conselheiros,

 

De todo o exposto, não é leviano dizer que outra seria a atitude a se esperar do órgão a que a Constituição da República Federativa do Brasil incumbiu da defesa da ordem jurídica, mormente quando é histórica e briosa a luta por sua prerrogativa de executar ações de investigação criminal, quando d’outra banda aguerridamente sustentavam que a norma constitucional fixava monopólio da atividade de polícia judiciária; e foi o Supremo Tribunal Federal, vencidos os tempos e as convicções é que fixou a alvissareira tese, afirmada mais recentemente (14/05/2015) por seu Pleno, no julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO 593.727-MG, cuja relatoria coube ao Ministro GILMAR MENDES, que noutros precedentes já assentara de maneira assaz pedagógica:

“1. POSSIBILIDADE DE INVESTIGAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. EXCEPCIONALIDADE DO CASO. Não há controvérsia na doutrina ou jurisprudência no sentido de que o poder de investigação é inerente ao exercício das funções da polícia judiciária – Civil e Federal –, nos termos do art. 144, § 1º, IV, e § 4º, da CF. A celeuma sobre a exclusividade do poder de investigação da polícia judiciária perpassa a dispensabilidade do inquérito policial para ajuizamento da ação penal e o poder de produzir provas conferido às partes. Não se confundem, ademais, eventuais diligências realizadas pelo Ministério Público em procedimento por ele instaurado com o inquérito policial. E esta atividade preparatória, consentânea com a responsabilidade do poder acusatório, não interfere na relação de equilíbrio entre acusação e defesa, na medida em que não está imune ao controle judicial – simultâneo ou posterior. O próprio Código de Processo Penal, em seu art. 4º, parágrafo único, dispõe que a apuração das infrações penais e da sua autoria não excluirá a competência de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. […]”. (STF. HC 84965/MG. 2ª Turma. Relator Ministro GILMAR MENDES. Julgamento em 13/12/2011).

 

A despeito disso e a par de até hoje não restar editada Emenda Constitucional, Súmula Vinculante ou “mero” verbete sumular, não se soube de haver o Ministério Público – zelador da ordem jurídica que é – deixado de promover investigações criminais…

Nesse mesmíssimo diapasão, porque agora o Ministério Público do Estado de São Paulo espera que as autoridades policiais militares abdiquem ou prevariquem (por sentimento pessoal de pusilanimidade ou subserviência institucional) às suas atribuições constitucionais e legais, tão somente a “manu militari”, sob os golpes do cajado que se revelam na forma da Recomendação ora impugada?

Ainda que conhecendo – e até mesmo respeitando a existência de opiniões divergentes – no mais das vezes enviesadas n’alguns vetores do pensamento político-ideológico e sem qualquer fundamento estribado na ciência do Direito, vale repisar a advertência do filósofo Gaston Bachelard:

“Não se pode basear nada na opinião: antes de tudo, é preciso destruí-la. Ela é o primeiro obstáculo a ser superado”…

 

Ademais, não são poucos os que se opõe à existência da Justiça Militar, das polícias militares e, até mesmo, de instituições e princípios militares; nossa história é repleta de duas coisas: (i) tentativas de aniquilá-las e (ii) frustrações porque a cada delas as “novatio legis” reafirmam sua existência, necessidade e ainda ampliam sua competência e atribuições… V.G.: Lei nº 9.299, de 1996; Emenda Constitucional nº 45, de 2004 e; mais recentemente, Lei nº 13.491, de 2017.

 

DO PEDIDO

Isto posto se requer que, nos termos do disposto no artigo 130-A, § 2º, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil, e artigos 2º, inciso II, e 118 do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público, seja desconstituído o ato administrativo ora impugnado (Doc. 02 e 03), por flagrante violação notadamente aos artigos 3º, 5º e 6º, da RESOLUÇÃO CNMP N° 164, DE 28 DE MARÇO DE 2017.

 

Termos em que,

Pede deferimento.

São José do Rio Preto, 28 de novembro de 2018.

 

(Assinado Digitalmente)

Azor Lopes da Silva Júnior

Advogado OAB/SP 355.482

—————————————————————————————————————————————–

[1] “Estatuto Social. Art. 1º. […] II – promover a representação e a defesa judicial e extrajudicial dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos Oficiais Militares do Estado de São Paulo, ativos ou inativos, podendo, para tanto, ajuizar mandado de segurança, individual ou coletivo, mandado de injunção, ação direta de inconstitucionalidade e outras medidas, independentemente de autorização assemblear; […] VIII – defender princípios e garantias institucionais, a valorização, independência administrativa e operacional dos Oficiais da Polícia Militar, assegurando a efetividade de seus predicamentos e funções, bem como dos meios previstos para o seu exercício; […] Parágrafo único. São considerados, dentre outros, assuntos de interesse institucional para a “Defenda PM”, as questões referentes: I – às instituições militares, nos planos constitucionais, federal e estadual, bem como no plano infraconstitucional, mormente aquelas que tendam a violar a competência constitucional e legal das Polícias Militares;”.

[2] Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: […] § 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe: […]; II zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas;

[3] Art. 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe: […] II – zelar pela observância do artigo 37 da Constituição Federal e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas; […] Art. 118. Caberá reclamação para preservar a competência do Conselho ou garantir a autoridade de suas decisões plenárias. § 1º A reclamação poderá ser instaurada de ofício pelo Plenário ou mediante provocação de qualquer cidadão, devendo ser instruída com prova documental. § 2º Se a reclamação noticiar descumprimento de julgado do Conselho, serão a ela apensados os autos do procedimento em que prolatado o decisório alegadamente violado, com posterior distribuição.

[4] Disponível em:  http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Criminal/Recomendacoes/CrimesDoloso_PM.pdf

[5] § 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

[6] § 2° Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça comum. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.299, de 07 de agosto de 1996).

[7] O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no dia 28 de agosto de 2017, propôs, com alegado fundamento no disposto no artigo 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, perante o Órgão Especial do Egrégio Tribunal de Justiça bandeirante, AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Resolução nº 54, de 18 de agosto de 2017, do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, que dispõe sobre apreensão de instrumentos ou objetos em Inquérito Policiais Militares, que tenham relação com a apuração dos crimes militares definidos em lei, quando dolosos contra a vida de civil, em obediência ao disposto no artigo 12, alínea “b” do Código de Processo Penal Militar, a autoridade policial militar a que se refere o § 2º do artigo 10 do mesmo Código.

[8] Na essência essa Resolução SSP-40, de 24-03-2015, renova a Resolução SSP- 45, de 06.04.2011, e sua antecessora Resolução SSP-110, de 19-07-2010; vale mencionar que passados 6 dias de sua edição, sobrevém a Resolução SSP-41, de 30-03-2015, para dar nova redação à cabeça do artigo 3º daquela Resolução SSP-40, de 24-03-2015, passando simplesmente a constar: “O Ministério Público será imediatamente comunicado das ocorrências”, quando a redação anterior vinha nos seguintes termos: “O Ministério Público será imediatamente comunicado das ocorrências, para que, se entender cabível, determine o comparecimento de um Promotor de Justiça ao local dos fatos”.

[9] Resolução nº 054/2017. Dispõe sobre apreensão de instrumentos ou objetos em Inquéritos Policiais Militares. O Presidente do Tribunal de Justiça Militar, no uso de suas atribuições legais e regimentais; CONSIDERANDO que o § 4º do artigo 125 da Constituição Federal dispõe que os crimes militares definidos em lei, quando dolosos contra a vida de civil, são da competência do júri; CONSIDERANDO que o § 2º do artigo 82 do Código de Processo Penal Militar dispõe que nesses casos a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à Justiça Comum; CONSIDERANDO que os Títulos II e III do Livro I do Código de Processo Penal Militar tratam detalhadamente do exercício da polícia judiciária militar e da elaboração do inquérito policial militar; CONSIDERANDO que, ainda assim, quando da instauração de inquéritos policiais militares para apuração de crimes dolosos contra a vida de civil, algumas dúvidas têm surgido sobre o correto proceder em relação à apreensão de instrumentos ou objetos que digam respeito ao fato; CONSIDERANDO a conveniência de se disciplinar o assunto, evitando que essas dúvidas resultem no desatendimento do princípio constitucional da celeridade no trâmite desses feitos; CONSIDERANDO o decidido pelo E. Pleno na Sessão Administrativa Extraordinária de 18 de agosto de 2017; RESOLVE:

Art. 1º Em obediência ao disposto no artigo 12, alínea “b”, do Código de Processo Penal Militar, a autoridade policial militar a que se refere o § 2º do artigo 10 do mesmo Código, deverá apreender os instrumentos e todos os objetos que tenham relação com a apuração dos crimes militares definidos em lei, quando dolosos contra a vida de civil.

Art. 2º Em observância ao previsto nos artigos 8º, alínea “g”, e 321 do Código de Processo Penal Militar, a autoridade de polícia judiciária militar deverá requisitar das repartições técnicas civis as pesquisas e exames necessários ao complemento da apuração dos crimes militares definidos em lei, quando dolosos contra a vida de civil.

Art. 3º Nos casos em que o órgão responsável pelo exame pericial proceder a liberação imediata, o objeto ou instrumento deverá ser apensado aos autos quando da remessa à Justiça Militar, nos termos do artigo 23 do Código de Processo Penal Militar.

Art. 4º Nas hipóteses em que o objeto ou instrumento permaneça no órgão responsável pelo exame pericial e somente posteriormente venha a ser encaminhado à autoridade de polícia judiciária militar, esta deverá também prontamente, quando do recebimento, efetuar o envio desse material à Justiça Militar, referenciando o procedimento ao qual se relaciona.

Parágrafo único – O mesmo procedimento deverá ser adotado pela autoridade de polícia judiciária militar quando do recebimento do laudo ou exame pericial.

[10] “Na espécie, eventual procedência da assertiva de inconstitucionalidade acarretará severos prejuízos de ordem administrativa, prejudicando, sobremaneira, os atos investigativos produzidos durante a eficácia da Resolução objurgada. Daí por que, defiro a medida liminar pleiteada, a fim de determinar a suspensão, com efeitos ex nunc, da eficácia da Resolução impugnada, até julgamento final deste colegiado.” (ADI (Estadual) nº 2166281-19.2017.8.26.0000. Relator Desembargador PÉRICLES PIZA. Julgado em 13 de setembro de 2017).

[11] “O CAOCrim, com a finalidade de uniformizar (e fortalecer) a postura dos órgãos de execução do MP, confeccionou modelo de RECOMENDAÇÃO” (Disponível em:  http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Criminal/Recomendacoes/CrimesDoloso_PM.pdf); “RECOMENDAÇÃO. ATRIBUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO: CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL e/ou CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA” (Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Criminal/Noticias_CAO_Criminal/RECOMENDA%C3%87%C3%83O-PM-crime%20doloso%20contra%20a%20vida-vers%C3%A3o%20final.pdf).

[12] Art. 3º O Ministério Público, de ofício ou mediante provocação, nos autos de inquérito civil, de procedimento administrativo ou procedimento preparatório, poderá expedir recomendação objetivando o respeito e a efetividade dos direitos e interesses que lhe incumba defender e, sendo o caso, a edição ou alteração de normas. §1º Preliminarmente à expedição da recomendação à autoridade pública, serão requisitadas informações ao órgão destinatário sobre a situação jurídica e o caso concreto a ela afetos, exceto em caso de impossibilidade devidamente motivada. §2º Em casos que reclamam urgência, o Ministério Público poderá, de ofício, expedir recomendação, procedendo, posteriormente, à instauração do respectivo procedimento. […] Art. 5º Não poderá ser expedida recomendação que tenha como destinatária(s) a(s) mesma(s) parte(s) e objeto o(s) mesmo(s) pedido(s) de ação judicial, ressalvadas as situações excepcionais, justificadas pelas circunstâncias de fato e de direito e pela natureza do bem tutelado, devidamente motivadas, e desde que não contrarie decisão judicial. Art. 6º Sendo cabível a recomendação, esta deve ser manejada anterior e preferencialmente à ação judicial. (grifos nossos).

[13] Art. 4º Incumbe aos órgãos do Ministério Público, quando do exercício ou do resultado da atividade de controle externo: […] IX – expedir recomendações, visando à melhoria dos serviços policiais, bem como o respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa seja de responsabilidade do Ministério Público, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis.

[14] “RESOLUÇÃO CNMP N° 164, DE 28 DE MARÇO DE 2017. Art. 1º A recomendação é instrumento de atuação extrajudicial do Ministério Público por intermédio do qual este expõe, em ato formal, razões fáticas e jurídicas sobre determinada questão, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela instituição, atuando, assim, como instrumento de prevenção de responsabilidades ou correção de condutas. Parágrafo único. Por depender do convencimento decorrente de sua fundamentação para ser atendida e, assim, alcançar sua plena eficácia, a recomendação não tem caráter coercitivo.” (grifei).

[15] Maria Sylvia Zanella Di Pietro assim define esse atributo: “consiste a autoexecutoriedade em atributo pelo qual o ato administrativo pode ser posto em execução pela própria Administração Pública, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário.” (Direito Administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 207).

[16] Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: I – os crimes de que trata êste Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial; II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados: (Redação dada pela Lei nº 13.491, de 2017) a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado; b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil; c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil; (Redação dada pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996) d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil; e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar; f) revogada. (Redação dada pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996) III – os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar; b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo; c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras; d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquêle fim, ou em obediência a determinação legal superior. § 1º. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 13.491, de 2017). § 2º. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto: (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017). I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa; (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017) II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017) III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais: (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017) a) Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica; (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017) b) Lei Complementar nº 97, de 9 de junho de 1999; (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017) c) Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969 – Código de Processo Penal Militar; e        (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017) d) Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral.      (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017).

[17] Art. 6º Obedecerão às normas processuais previstas neste Código, no que forem aplicáveis, salvo quanto à organização de Justiça, aos recursos e à execução de sentença, os processos da Justiça Militar Estadual, nos crimes previstos na Lei Penal Militar a que responderem os oficiais e praças das Polícias e dos Corpos de Bombeiros, Militares. (grifei).

Art. 7º A polícia judiciária militar é exercida nos têrmos do art. 8º, pelas seguintes autoridades, conforme as respectivas jurisdições: […] § 1º Obedecidas as normas regulamentares de jurisdição, hierarquia e comando, as atribuições enumeradas neste artigo poderão ser delegadas a oficiais da ativa, para fins especificados e por tempo limitado. (grifei).

[18] Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.

[19] Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. […] § 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) § 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) § 5º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).

[20] Homicídio simples. Art. 205. Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos. Minoração facultativa da pena. § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena, de um sexto a um têrço. Homicídio qualificado. § 2° Se o homicídio é cometido: I – por motivo fútil; II – mediante paga ou promessa de recompensa, por cupidez, para excitar ou saciar desejos sexuais, ou por outro motivo torpe; III – com emprêgo de veneno, asfixia, tortura, fogo, explosivo, ou qualquer outro meio dissimulado ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV – à traição, de emboscada, com surprêsa ou mediante outro recurso insidioso, que dificultou ou tornou impossível a defesa da vítima; V – para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; VI – prevalecendo-se o agente da situação de serviço: Pena – reclusão, de doze a trinta anos.

[21] CPPM. Art. 2º A lei de processo penal militar deve ser interpretada no sentido literal de suas expressões. Os têrmos técnicos hão de ser entendidos em sua acepção especial, salvo se evidentemente empregados com outra significação. § 1º Admitir-se-á a interpretação extensiva ou a interpretação restritiva, quando fôr manifesto, no primeiro caso, que a expressão da lei é mais estrita e, no segundo, que é mais ampla, do que sua intenção. (grifei).

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