Dois séculos ainda é pouco, mas ao mesmo tempo é uma marca memorável que todos nós temos o orgulho de viver neste momento de delicioso ufanismo:
Já podeis, da pátria filhos, ver contente a mãe gentil. Já raiou a liberdade no horizonte do Brasil. Brava gente brasileira! Longe vá, temor servil. Ou ficar a pátria livre ou ou morrer pelo Brasil. Os grilhões que nos forjava, da perfídia astuto ardil, houve mão mais poderosa, zombou deles o Brasil. Não temais ímpias falanges, que apresentam face hostil; vossos peitos, vossos braços, são muralhas do Brasil. Parabéns, ó brasileiro, já, com garbo varonil; do universo entre as nações, resplandece a do Brasil.
A letra, do jornalista (fundador do “Aurora Fluminense”), livreiro (Rua dos Pescadores, n. 49, Rio de Janeiro) e político (deputado por Minas Gerais), Evaristo Ferreira da Veiga e Barros – ou simplesmente Evaristo da Veiga – evoca um nacionalismo ardente mas, o que poucos sabem, resultou tão somente de uma reação de um leal monarquista, nascido em 8 de Outubro de 1799, filho do português nativo Francisco Luiz Saturnino da Veiga e de dona Francisca Xavier de Barros, que sonhava um Brasil parte do Reino Unido de Portugal e que se desencantou ao ver a Corte portuguesa, quando da volta da Família Real à Europa, desdenhar desse sonho de sua ex-colônia; assim registra a história:
“Se entre os homens que encabeçaram o movimento constitucional em Portugal havia um ou outro de feitio liberal extreme e s’incero, querendo a liberdade tambem para o Brasil, no fundo do movimento fermentavam despeitos, resentimentos, queixas contra a preponderancia que a antiga colonia assumira desde· que a familia real nella se estabelecera. O manifesto inaugural das Côrtes de Lisbôa era a melhor prova disso. E não tardaram os constitucionalistas de Portugal em demonstrar a sua malquerença, o seu desamor e a sua incomprehensão das cousas do Brasil. Foi quando despertou em Evaristo o verdadeiro patriota, vendo em sua terra uma patria á parte, o Brasil. ‘Ao Brasil’ fazia um soneto em 17 de outubro de 1821, em que affirmava: ‘Minha Patria, oh Brasil!’ …” (in verbis SOUSA, Octavio Tarquinio. Evaristo da Veiga. Serie 5.ª Brasiliana. Vol. 157. São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre: Companhia Editora Nacional, 1939).
Evaristo da Veiga foi membro do Instituto Histórico de França e da Arcádia de Roma, patrono da cadeira nº 10 da Academia Brasileira de Letras, por escolha de seu fundador, Rui Barbosa, além de iniciado na Maçonaria em 1 de junho de 1832, na Loja Esperança de Nictheroy n° 0003, no Rio de Janeiro.
Octavio Tarquinio Sousa reproduz as palavras de Evaristo da Veiga que deram origem ao sentimento nacionalista: “Leis para nós, por nós querenios feitas… Que a futura grandeza nos preparem… Já não mais precisanios de Senhores que desde além do Atlantico nos mandem Reis, despostas e ferros: eia acabem da triste escravidão os grandes annos“. Isso vem em 1822 a reboque do então “Hymno Constitucional Brasiliense“, datado de 16 de agosto, e o bordão “Brava gente brasileira“, seguido dos versos “Já podeis filhos da Patria, Vêr contente a mãe gentil; Já raiou a Liberdade, No horizonte do Brasil” inflamou a sociedade para impedir o desembarque de tropas portuguesas; surgia o “Hymno Marcial”.
“Por modestia, por timidez, certamente por patriotismo, para não diminuir a aureola romantica de D. Pedro, o verdadeiro autor da letra do “Brava Gente Brasileira” se deixou ficar quieto, indifferente á gloria“, diz Octavio Tarquinio Sousa, que a letra do Hino foi atribuída a D. Pedro I; o autor relata, ainda: “Para a sua gloria, quizeram os fados um desfecho rapido, o descanso na morte, em plena força da maturidade, aos 38 annos incompletos. Deixando a casa de Feijó, Evaristo, mal refeito de uma viagem penosa, talvez infectado por germens dos males epidemicos reinantes em lagares por onde passara, foi para a cama, presa de febre violenta e, ás 13 horas do dia 12 de Maio [1937], morreu, cercado da mqlher, das filhas pequeninas e dos irmãos João Pedro e Bernardo, tendo recebido todos os sacramentos. Os medicas attribuiram a morte a “febre perniciosa” ou uma “pericardites”, filiando o mal a que succumbiu á exaltação da entrevista com Feijó“.
A vida e obra de Evaristo da Veiga nos mostra como o ser humano é, acima do intelecto e das posses, um animal emocional; de leal súdito da coroa portuguesa brotou um nacionalista capaz de, malgrado sua timidez e humildade, lançar as palavras de ordem que agitaram a sociedade e a inspiraram emocionalmente para se tornar uma nação.
No alvorecer de nossos 5 anos de fundação, o Instituto Brasileiro de Segurança Pública espera despertar, na sociedade e nos pesquisadores da Academia, um novo olhar (independente) sobre essa área tão essencial no campo das políticas públicas: a segurança.
Eia! Sus, oh, sus!
redação
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