Apesar de votar pela admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 18, de 2025, de autoria do Poder Executivo (Altera os art. 21, art. 22, art. 23, art. 24 e art. 144 da Constituição, para dispor sobre competências da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios relativas à segurança pública), com as emendas supressivas, destacam-se no parecer apresentado pelo Relator, o Deputado Federal JOSÉ MENDONÇA BEZERRA FILHO (UNIÃO – PE), alguns pontos significativos, sob o ponto de vista jurídico que, nesta fase do processo legislativo, é o único objeto de apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania:
De início, nota-se, até com certo espanto, que a proposição introduz ao texto constitucional modificações incompatíveis entre si: ou a matéria é de competência privativa da União ou é de competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal. Não se pode ser as duas coisas ao mesmo tempo. Os termos sob exame são inconciliáveis e estranhos à própria sistemática de repartição de competências consagrada no texto constitucional. Não estamos, contudo, diante de um mero problema de má técnica legislativa. Como demonstraremos a seguir, a inclusão do inciso XXXI ao artigo 22, da Constituição Federal, é medida tendente a abolir a forma federativa de Estado, naquela porção específica da divisão de competências que disciplina a estrutura institucional-federativa da segurança pública. Entendemos, portanto, ser o caso de suprimi-la nesse juízo de admissibilidade.
Realmente é de se espantar que um ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, hoje ocupando o cargo de Ministro de Estado da Justiça e da Segurança Pública, tenha cometido um erro jurídico-constitucional tão primário, ao propor que se inclua no artigo 22 da Constituição da República um inciso XXXI estabelecendo que “Compete privativamente à União legislar sobre: […] XXXI – normas gerais de segurança pública, defesa social e sistema penitenciário”; ora, o artigo 22 cuida de competências que são privativas da União e “legislar sobre normas gerais” é algo próprio do campo da competência concorrente fixada no artigo 24 da Lei Maior… Não se trata de concordar ou não com a proposta e, ao que parece, mostrou-se até indulgente o Relator, diante de uma incongruência insuperável do Direito Constitucional.
A saída elegante veio nos seguintes termos:
A mudança pretendida pela Presidência da República, a pretexto de redistribuir competências entre os entes federativos, desnatura o núcleo essencial da estrutura institucional-federativa da segurança pública. Medidas centralizadoras, como a ora examinada, violam a identidade do arranjo federativo previsto para a segurança pública e devem ser inadmitidas de pronto. Por essas razões, somos favoráveis que se suprima o inciso XXXI do artigo 22, incluído pelo artigo 1º da Proposta de Emenda à Constituição nº 18, de 2025.
Outra questão, que foi bem observada pelo Relator MENDONÇA FILHO, foi a de se inserir um §2º-B, no artigo 144 da Carta da República, estabelecendo que “A polícia viária federal, no exercício de suas competências, não exercerá funções inerentes às polícias judiciárias nem procederá à apuração de infrações penais, cuja competência é exclusiva da polícia federal e das polícias civis, assegurada, na forma da lei, a atividade de inteligência que lhe é própria“; não nos parece leviano levantar a hipótese de, nessa questão em particular, o Ministro ter-se rendido à interferências corporativas das entidades associativas de Delegados de Polícia; mas, novamente, o apontamento do Relator foi mais contemporizador:
Por afrontar o devido processo legal, o princípio da separação de Poderes, a independência funcional do Ministério Público, cercear a atuação investigativa das CPIs e, em última instância, indiretamente enfraquecer a proteção dos direitos e garantias individuais e do próprio Estado Democrático de Direito, ensejando conflagrações institucionais que inviabilizam uma persecução penal efetiva e confiável, somos, também, favoráveis que se suprima o termo “exclusiva” do §2º-B, do artigo 144, incluído pelo artigo 1º da Proposta de Emenda à Constituição nº 18, de 2025, o que será suficiente para sanar o vício de inconstitucionalidade.
Finalmente, analisemos o fato de que o artigo 21 da Constituição da República cuida daquilo que a doutrina chama “competência material exclusiva” da União, daí porque indelegável competência e, veja-se, que se propõe um parágrafo únicos nos seguintes termos “As competências da União de que tratam os incisos XXVII e XXVIII do caput não excluem as competências comuns e concorrentes dos demais entes federativos relativas à segurança pública e à defesa social, nem restringem a subordinação das polícias militares, civis e penais e dos corpos de bombeiros militares aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal.”, o que mostra nova insuperável incongruência jurídica ao se misturar o que é indelegável (competência exclusiva) com o que é compartilhado (competência material comum e competência legislativa concorrente); mais um um erro jurídico-constitucional tão primário…
Nesse ponto, o Relator foi novamente cavalheiresco:
A inserção do inciso XXVII ao art. 21 da Constituição Federal, que limita o Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social a uma mera oitiva, tende a uma centralização de poder na União, esvaziando a participação dos demais entes federados e da sociedade civil. O vocábulo “coordenar” no inciso XXVIII, igualmente acrescido ao art. 21, carece de precisão semântica e, em que pese a pretensa horizontalidade, infere-se uma limitação da discricionariedade dos órgãos do Susp, propiciando indesejável ingerência federal em competências estaduais, distritais e municipais, com potencial colisão com prioridades locais.
Assim, a Proposta de Emenda à Constituição nº 18, de 2025, de autoria do Poder Executivo se arrasta, mesmo antes de se enfrentar o mérito que em quase nada agrega aos graves e antigos problemas da segurança pública no país…
Prof. Dr. Azor Lopes da Silva Júnior
Presidente do Instituto Brasileiro de Segurança Pública
redação
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